quarta-feira, 23 de julho de 2008

Quem lê tanta notícia?

Recentemente eu me vi perdida em minha rotina. Com tanto tempo livre eu me vi sem tempo pra nada. Acho que deve ser comum entre as pessoas que trabalham em casa. Como disse um amigo, a gente costuma dividir os dias entre os que fazemos mil coisas e os dias em que não fazemos porra nenhuma. Daí eu resolvi devidir as horas para o meu dia de modo a dar conta das minhas atividades de esposa-e-dona-de-casa, perua, acadêmica e escritora, com tempo pra ver tevê, cuidar do meu gato, vadiar na internet e dormir 10 horas por dia.

E não é que para minha surpresa está dando certo?

Uma das atividades incluídas em minha recém-criada rotina é ver notícias de algum modo, seja no rádio, televisão ou internet. Não que eu goste muito ou ache realmente necessário, mas o meu trabalho depende disso. Na maioria das vezes o noticiário me irrita ou me faz rir. Irrita em casos dos comentários fascistinhas dos âncoras dos telejornais pedindo que se mude a Constituição para que as pessoas sejam obrigadas a soprar no bafômetro. Toda vez eu eu ouço uma sugestão dessa eu imagino que em seguida o cara vai soltar uma do tipo "no tempo dos militares é que era bom". Mas o noticiário também me diverte, sobretudo quando a edição do rádio ou tevê não corta a pergunta do repórter e expõe a profunda ignorância desses profissionais. Sabem, eu já fui repórter e sei como é ir a uma pauta sem a menor noção do assunto e ter como guia apenas o Sr. Google.

Mas o que eu gosto mesmo do noticiário é ver que tipo de valor permeia o imaginário social das pessoas. Mês passado, por exemplo teve um rapaz que na prova final da faculdade de artes reuniu um bando de pixadores e rabiscou toda a faculdade. O moço foi expulso. Sabe como é, nesses lugares as pessoas ficam falando de ousadia e quebrar paradigmas. E tome performance com gente pelada! Mas na hora que isso chega ao sagrado patrimônio todo moderninho mostra a TFP que tem dentro de si... Enfim, ontem eu ouvi no rádio uma entrevista com um arte-educador respondendo à repórter se grafite era arte ou não. Aí ele contou que era arte sim, que estava sendo finalmente reconhecido pela academia e que a Prefeitura pintou por engano um grafite de dois artistas famosos.

Veja bem, caro leitor. Sem querer o rapaz que dizia que era arte estava estabelecendo a fronteira entre a arte e a não-arte, que é a mesma da faculdade: tem que ser muito moderno e muito ousado, mas faça isso onde pode, porque senão a Prefeitura passa por cima e só se arrepende depois que descobre que você é famoso. É claro que a repórter ignorante, não vê nada disso ou finge que não vê. Porque eles estavam muito preocupados em legitimar a arte grafite. Ora, se uma forma de expressão precisa do reconhecimento acadêmico-midiático pra que ela se legitime perante si mesma é melhor parar e inventar outra coisa, porque isso aí já morreu. Eu jamais perderia meu tempo discutindo o valor artísticos dos blogs, tudo o que me importa é que existe essa ferramente fácil na qual as pessoas podem escrever e ser lidas. Dane-se o que os especialistas acham disso.

Mas o rapaz estava se levava muito a sério e levantava hipóteses pseudo-antropológicas pra dizer que antigamente o homem escrevia nas paredes das cavernas e que agora não há mais cavernas, portanto... Ai, pára! Tenho preguiça dessas coisas. Elas só me fazem dar risada, porque eu não consigo conceber o quanto todo mundo envolvido na trama se leva tão a sério. O arte-educador, o artista, a repórter, os críticos... é todo mundo tão cheio de certezas que eu não sei como eles são capazes de se iludir achando que estão em busca de algo novo.

3 comentários:

Ancorada disse...

Ótimo texto Marie!!! Sobre esse lance de perguntas cretinas, me lembrei das pérolas que surgem nas coletivas, ai, ai...
Também adorei o post anterior.


Fiquei curiosa em saber sua opinião sobre o CQC.

Beijo!

Anônimo disse...

Perdoem-nos. Eles sabem o que fazem? Rs

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.