quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Alma de criança

Cena 1: Há uns meses eu estava conversando com uma amiga sobre ter filhos. Eu estava falando do meu receio porque é "puta responsabilidade, meu". Ela disse que esse negócio de fazer planos pro futuro já era, que o futuro é agora, que nós já somos adultas, que eu estou casada há um tempinho, estou feliz e é isso que as pessoas felizes no casamento fazem.

Cena 2:
Um dia eu e meu marido fomos nos deitar e ele entrou no quarto um tanto perplexo. Disse que se surpreendeu ao fechar a casa pra dormir, que lembrou do pai dele fazendo isso e me disse que "nós viramos pais de família".

Cena 3:
Há umas semanas eu conheci Catarina, sete anos, sobrinha de uma grande amiga. Eu não sei interagir com criança, falo com elas como se fossem adultos e pra diverti-los falo coisas curiosas-porém-divertidas, como "você sabia que seu pé é do tamanho do seu antebraço?" ou "sabia que é impossível lamber o próprio cotovelo?". Dias depois minha amiga me disse que Catarina não me achou com jeito de adulto. Que adulto só quer saber de "resolver as coisas" e que eu me divertia. Disse que eu tinha alma de criança. Foi um dos elogios mais bonitos que lembro ter recebido na vida.

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Essas três cenas ilustram momentos de passagem. Quando foi que o futuro começou? Quando foi que nos tornamos adultos? O que separa os anos vividos da alegria de viver das crianças? Eu já pensei bastante sobre isso, mas não é algo que me afete muito. Não hoje em dia pelo menos. Prefiro ir vivendo ao invés de ter crises a respeito do inevitável.

Melhor envelhecer do que morrer. Houve um tempo em que eu pensava muito na morte e achava insuportável a idéia de viver sabendo que vamos morrer. Minha crise era em relação ao sentido da existência e sobre o que há depois que todas as luzes se apagam. Por isso eu tenho vontade de de socar as pessoas que surtam porque os anos estão passando e o corpinho/rostinho não é mais o mesmo. Vai ser fútil assim no inferno. Eu tenho medo é de perder a sanidade, de não saber mais quem sou, de ter uma doença grave e morrer aos poucos, de ser tão dependente a ponto de não poder mais ir ao banheiro sozinha.

Enfim, eu não sei se o futuro já começou. Ontem eu me matriculei na autoescola e isso me deixou atordoada. Eu acho que me senti "resolvendo coisas". Não que no meu dia-a-dia eu não tenha coisas pra resolver. Mas eu luto pra que a minha vida não se resuma a isso. Eu estudo não para obter títulos, mas pelo prazer da jornada. Talvez tenha sido isso que Catarina viu nas poucas horas que passamos juntas. Eu estou neste mundo a passeio, não pelos objetivos a atingir. Já dizia o sábio Humberto Gessinger, "não precisamos saber pra onde vamos, nós só precisamos ir. Sem motivos, nem objetivos, estamos vivos e só". Não sei se isso faz de mim mais ou menos adulta, mas com certeza me faz feliz.

2 comentários:

Syntia disse...

antes eu pensava que era melhor envelhecer do que morrer, mas estou me descobrindo uma covarde, não quero ver meus queridos indo, to começando a preferir ir primeiro!!!!

FM disse...
Este comentário foi removido pelo autor.